ADOLESCÊNCIA- GRUPO DE ORIENTAÇÃO VOCACIONAL

 

 

JLBelas – setembro de 2021

INTRODUÇÃO

        Há muitos anos, quando eu ainda era um estudante do Curso de Psicologia de Universidade do Brasil (hoje UFRJ), fui apresentado a um livro que, até hoje, me ensina e me mostra que há características nos seres humanos que não mudam com o passar do tempo.

        Aprendi isso ao ler o Manual de Psicologia Infantil, organizado por Leonard Carmichael, publicado pela Editora El Ateneo 1964 …

        Um dos capítulos desse maravilhoso livro é dedicado ao tema Adolescência e escrito por Horrocks, J.

        Esse autor, em seu interessante estudo sobre essa fase do desenvolvimento humano, sugere haver, nela, cinco características principais. Segundo esse autor, existem cinco pontos focais em torno dos quais tendem a se agrupar os problemas de comportamento e de adaptação desses jovens. Podemos considerá-los como pontos de referência para podermos compreender o desenvolvimento e crescimento do adolescente e os resumiremos aqui, assim:

  • A adolescência tende a ser uma época de estado exploratório, como indivíduo. Existe uma tendência a sair do estado de submissão à autoridade paterna e a lutar contra as relações com os adultos aos quais estava  subordinado na base da inferioridade em relação à idade, experiência e habilidade. Surge o desenvolvimento e interesse por profissões visando conseguir uma independência econômica.

  • É um período no qual as relações com seus iguais adquirem uma importância primordial. Busca uma posição igual a dos companheiros e espera deles o reconhecimento desta igualdade. Surge também o interesse heterossexual.

  • É uma fase de desenvolvimento físico e de crescimento, com mudanças corporais rápidas que exigem um ajuste da imagem corporal e dos padrões motores existentes. Alcança a maturidade física.

  • A adolescência caminha na direção à expansão e desenvolvimento intelectuais e às experiências acadêmicas. Há um aumento de sua experiência e de conhecimento em muitos campos o que o leva a poder interpretar seu ambiente à luz dessa experiência.

  • É uma época de desenvolvimento e crítica dos valores associado a um aumento da consciência de seu EU, ao desenvolvimento dos próprios ideais e à necessidade de aceitação do seu eu em harmonia com aqueles ideais. Observa-se a existência de uma discrepância entre o idealismo infantil e a realidade.

Essas afirmações propostas por Horrocks, J.  me fizeram pensar que, ao tentarmos ajudar as pessoas que se encontram nessa etapa da vida, precisamos levar em consideração tais características.

Desde a antiguidade , até hoje, o jovem continua despertando em todos nós, educadores, pais, orientadores e psicólogos, um grande interesse, pois, como nos tempos antigos, esta fase da vida ainda se caracteriza por um momento de grandes conflitos, de angústias, de inseguranças, principalmente por ser o ponto exato onde se processam as mudanças significativas na sua vida.

Entre uma série de transformações que ocorrem nesse período vital, encontramos uma que se mostra bastante intensificada em nossos dias: a escolha profissional.

Num mundo de grande competição, onde não se tem tempo a perder, onde não se pode “errar” nas escolhas, sob pena de “ficar para trás”, o adolescente se vê muito pressionado quando chega ao final do ensino médio. Ele sabe que, para vencer, precisará ser bom no que se propuser a fazer profissionalmente.

Com as especializações cada vez mais diversificadas, com pouca informação sobre o mundo profissional e sobre si mesmo, o jovem fica profundamente perdido, sem saber por onde ir, nem o que fazer de seu futuro.

UMA ENTRE VÁRIAS MANEIRAS DE SE DECIDIR PELA FUTURA PROFISSÃO

Minha formação profissional teve como ponto de partida o treinamento, quase intensivo, em aplicação, avaliação e interpretação de testes, com o objetivo de fazer uma Orientação Vocacional. Isso ocorreu no início de 1967.

Durante muitos anos, apliquei testes, orientei muitos jovens através desses instrumentos, utilizando uma técnica muito interessante (que respeito até hoje), mas cuja dinâmica é menos excitante e estimulante do que a que utilizei nas últimas orientações, feitas em 1997.

No final de 1989, vivi uma experiência incrível. Como já mencionei acima, participei de um workshop sobre terapia expressiva. A figura central desse encontro, sem dúvida, foi Natalie Rogers.

Embora o objetivo daquele trabalho se ligasse, basicamente, à atividade clínica, os recursos e as técnicas empregadas por ela me levaram a pensar na possibilidade de utilização deles num campo diferente, a orientação vocacional.

Quando, no início de 1990, na escola onde eu trabalhava, me pediram que eu ajudasse alguns alunos do terceiro ano do ensino médio na definição de suas escolhas profissionais, imediatamente pensei em aplicar o que havia aprendido naquele workshop. Elaborei um pequeno projeto, fazendo nele adaptações necessárias para a utilização de algumas de suas técnicas no trabalho de orientação vocacional.

O grupo era composto de aproximadamente 17 alunos. Estavam ansiosos e preocupados por cursarem a última série do ensino médio, às vésperas do vestibular, e não terem ainda definido o que pretendiam fazer profissionalmente. Essa indefinição acarretava para eles um outro problema muito importante: em que turmas seriam inseridos de modo a receberem um reforço nas matérias mais específicas da prova que prestariam no vestibular. Portanto, enquanto eles não se definissem, não saberiam também que aulas deveriam, prioritariamente, frequentar. Por exemplo: os que fariam vestibular para engenharia não frequentariam algumas aulas destinadas ao grupo que iria fazer inscrição para letras, etc..

O clima que, normalmente surge numa situação desse tipo, é de tensão, nervosismo, irritabilidade.

Sem ter a pretensão de realizar um trabalho tradicional em orientação vocacional, propus-me a estar com esse grupo de alunos durante cinco sessões, de 90 minutos cada uma delas.

O que ficava mais claro naquele momento, onde tudo era novo, tanto para mim quanto para esses jovens, era que eu tentaria criar algumas condições favoráveis ao surgimento, neles, de uma percepção mais nítida do que sentiam em relação ao futuro. Esforçar-me-ia também para facilitar a tomada de consciência de suas dúvidas, medos, angústias, preconceitos em relação a algumas profissões e/ou atividades, assim como a das pressões que lhes eram impostas, cruelmente, pela sociedade e pela própria família.

O RESULTADO DESSES ENCONTROS

Tudo indica que o resultado que alcançamos com esse trabalho foi positivo.

Aprendi, através desses “grupos de orientação vocacional”, sobre a importância esse tipo de trabalho com adolescentes. Eles se mostraram muito criativos e muito interessados em novas experiências que desafiavam os modelos até então conhecidos por eles.  Por exemplo: era comum eles serem encaminhados para fazerem “testes vocacionais”. Entretanto, nos nossos “grupos de orientação vocacional” tudo era muito novo e diferente. Neles não havia nenhum tipo de teste, mas muitas conversas e trocas de experiências pessoais, de dúvidas, de medos… Isso fazia com que os  nossos encontros fossem aguardados com muita alegria e disposição.

A avaliação final desses grupos mostrou que houve uma evolução no modo dos alunos lidarem com as dúvidas e inseguranças que surgiam quando tinha que fazer suas escolhas profissionais. Ficaram mais relaxados e flexíveis quanto ao tempo e as áreas de seus interesses. Dessa forma a ansiedade deles baixou e deixaram de ver aquele momento de suas vidas como um “tudo ou nada”. Perceberam que poderiam ser aprovados no vestibular, ou não. Poderiam errar na escolha inicial, mas que também poderiam mudar de curso, se assim desejassem, sem que isso passasse a ser uma derrota…

Mais uma vez, ficou bem claro que a ACP, sempre que observados seus princípios básicos, é uma maneira de se trabalhar que pode ser utilizada nos mais diferentes contextos e situações.

Através deste relato que lhes apresentei aqui, quero reafirmar algumas convicções que, cada vez mais, ficam consolidadas em mim e que me mostram que os adolescentes, de todas as épocas e da atual, quando não são pressionados, quando são aceitos e compreendidos por nós em suas angústias e dúvidas, acabam encontrando, nessa forma de relacionamento, as condições favoráveis para o crescimento deles.

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OBS. Maiores detalhes sobre a experiência vivida com esse grupo de adolescentes, veja em http://jlbelas.psc.br/2020/09/01/psicologia-escolar-orientacao-vocacional-terapia-expressiva/