GRUPOS DE ENCONTRO – uma metodologia emocionante, vivências inesquecíveis

GRUPOS DE ENCONTRO

(Uma metodologia emocionante – Vivências inesquecíveis)

Jlbelas – abril de 2020

INTRODUÇÃO

O ano era 1966. O mês era março. O lugar, a Universidade do Brasil. Ali começava minha caminhada no território da Psicologia. Os primeiros anos, básicos, nem eram tão interessantes, a não ser algumas matérias que, mesmo antes de começar este curso, já me encantavam.

Passei por várias experiências como estagiário em várias áreas. Todas me enriqueceram e foram abrindo minha cabeça para uma observação mais ampla do universo no qual estive mergulhado por cinco anos seguidos. Três desses estágios foram marcantes para mim:

– no primeiro (de 1966 até 1970) tive como supervisor o querido e inesquecível Professor Franco Lo Presti Seminerio, com o qual aprendi muito sobre o rigor da pesquisa, Orientação Vocacional e Psicodiagnóstico através de vários instrumentos de medida e avalição utilizados nos anos de 1960;

– no segundo, ( durante todo o ano de 1968 )os supervisores foram os psicólogos do ISOP ( Instituto de Seleção e Orientação Profissional ) no Rio de Janeiro,  instituição essa ligada à FGV  (Fundação Getúlio Vargas);

– no terceiro, ( de 1967 até 1970 ) os supervisores foram meus professores do Curso de Psicologia da Universidade do Brasil (hoje UFRJ) e os psiquiatras do Hospital Estadual Psiquiátrico, de Jurujuba, Niterói-RJ.

Tive o privilégio, como apresentei acima, de estagiar e aprender bastante sobre três áreas da Psicologia, durante minha formação profissional: ESCOLAR, DO TRABALHO e a da CLÍNICA. Isso me ajudou muitíssimo e, talvez por causa dessa experiência diversificada, fez com que minha vida profissional fosse marcada por uma atitude exploratória nos diversos campos, principalmente naqueles por onde mais andei antes de me formar.

Sempre estive ligado a grupos, principalmente de música. Em muitas ocasiões tive oportunidade de atuar como líder na solução de pequenas dificuldades que costumam surgir quando se vive com várias outras pessoas tentando alcançar um objetivo comum.

As diferenças individuais, nessas situações de grupo, podem funcionar como fatores positivos, ou não, como enriquecedores e dinamizadores, ou, ao contrário, como bloqueadores que impedem os participantes de alcançarem os objetivos propostos por aquele grupo.

Experiências desse tipo, liderar grupos e tentar ajudá-los a resolver as dificuldades que haviam dentro deles, aconteceram comigo antes de eu começar a estudar Psicologia. Eu atuava de forma muito intuitiva, sem conhecimento teórico, ou técnico.

No ano de 1970 vivi uma experiência que, se por um lado era-me familiar, por outro me mostrava novos aspectos práticos e teóricos, contidos em muitas vivências antigas, minhas, relacionadas com o “estar em grupo”. Isso ocorreu na UFRJ, no curso de Psicologia, ao participar de um grupo de encontro liderado pelo Magistral Professor Rogério C. Buys.

A experiência que tive na UFRJ me mostrou vários aspectos muito importantes para que eu, a partir dali, passasse a entender um pouco mais sobre a dinâmica típica de um grupo “autodirigido”. A partir daquele momento, passei a ler mais sobre o tema e a me interessar por ele.

No final desse ano, 1970, formei-me. Nessa época já atuava como “facilitador de grupos” nas instituições nas quais trabalhava.  Uma delas era um Banco privado, uma outra era uma escola em Campos dos Goytacazes (RJ), e a terceira era um Hospital Psiquiátrico Público Estadual.

Nesses locais, todas as atividades de grupo eram realizadas por mim utilizando os conhecimentos que ia adquirindo na Universidade e através dos estudos que fazia sobre esse recurso de trabalho com grupos de pessoas.

Cada vez mais, lia as obras de Rogers, suas teorias e  aplicações delas nos diversos campos de “ajuda psicológica”. Li sobre a terapia não diretiva, a psicoterapia centrada no cliente, a terapia centrada na pessoa e sobre terapias de grupos e grupos de encontro.

Li também trabalhos escritos por Rogers, nos quais apresentava os resultados de seus achados em pesquisas nas da área de Clínica, educação e tantas outras, baseadas em suas teorias.

É claro que para mim, um iniciante na profissão, que antes de ingressar no curso de Psicologia já havia feito um pequeno, mas significativo, percurso pelo campo da Matemática, na UFF , assim como na área de humanas, também por um período pequeno, mas igualmente significativo, no curso de Direito da UFF, ler sobre as pesquisas de Rogers e colaboradores me dava um prazer indescritível. Pois, juntar o subjetivo ao objetivo era tudo o que eu buscava.

Esse fato, pesquisa em Rogers, foi fundamental para que eu mergulhasse de cabeça na leitura de seus trabalhos.

Sempre fui muito “rebelde” no que se refere a seguir as ideias dos outros, suas crenças e coisas assim. Sempre tentei realizar algo novo usando tudo o que eu aprendia nos diferentes campos do conhecimento. As propostas “rogerianas”, novidades para mim, funcionaram, a partir daquele momento, como disparadores de novas ideias  que se somavam àquelas que em mim já existiam. Por isso, já no final de 1977, comecei a realizar grupos de vários formatos. Sobre eles escreverei a seguir.

Não sei se certo, ou errado, sempre tive uma preocupação, de não me definir como seguidor de algum tipo de filosofia, de metodologia, ou de técnica. Talvez o meu modo de utilizar as teorias, sempre querendo achar algo nelas que me pudesse levar a inovar o que elas me traziam, seja o motivo de não me “definir” como um “rogeriano”.

Algumas pessoas, ao lerem alguns dos meus trabalhos, poderão estranhar o que ali afirmo, se compararem o que escrevo e o que Rogers escreveu. Por isso, tudo o que publico talvez não seja exatamente o que se costuma entender por um jeito de ser “rogeriano”, mas estou bastante tentado a crer que minhas propostas são bem próximas daquelas que costumo ler nos trabalhos dos que atuam  dentro de uma Abordagem Centrada na Pessoa.

Assim sendo, apresento a seguir uma série de algumas experiências que eu vivi ao trabalhar com vários tipos de grupos.

1- OS GRUPOS EXPERIMENTAIS NO HOSPITAL E O GRUPO DE ESTUDOS NO CONSULTÓRIO

Meu estágio no Hospital Estadual Psiquiátrico (Jurujuba-Niterói) começou em 1967. Nessa época minhas atividades nessa instituição eram basicamente restritas a entrevistas com os pacientes encaminhados a mim pelos psiquiatras dessa clínica.

Sempre estive interessado em trabalhar com grupos e, por isso, logo de início comecei a fazer reuniões com os pacientes e também com os funcionários daquele local.

Formei-me Bacharel em Psicologia em dezembro de 1969 e em 1970 já trabalhava oficialmente com grupos, como mencionei acima, em escola, banco e hospital, todavia estava longe de “aplicar uma metodologia que pudesse ser considerada a dos grupos de encontro dentro de uma perspectiva centrada na pessoa”.

Acho importante apresentar os fatos acima para que possam entender a minha ligação com esse tipo de trabalho, bem antes de me tornar um Psicólogo Clínico, coisa que ocorreria um ano depois, ao concluir minha faculdade, obtendo o direito pleno para exercer minha profissão.

Em Janeiro de 1971, já formado e com um consultório em atividade na cidade de Niterói-RJ, onde atuo até a presente data, criei um GRUPO DE ESTUDO SOBRE AS TEORIAS ROGERIANAS. Eu, e mais dois psicólogos, chegamos a criar um firma, registrada em cartório, chamada “CLÍNICA DE ORIENTAÇÃO PSICOLÓGICA CARL R. ROGERS” a qual teve uma vida breve porque nós tivemos que dissolver essa sociedade.

O motivo que nos levou a isso foi a ida de um deles para Banco Central em Brasília e de o outro ser chamado a reassumir seu cargo profissional no INSS. onde era lotado e do qual esteve em “disponibilidade” durante alguns anos. Por isso, somente eu continuei com o consultório ativo, até os dias atuais, e cancelei  o registro do COPSI.

Esse grupo de Estudos sobre Rogers durou cerca de cinco anos e, como já mencionei em outro documento intitulado “Uma Breve História de Psicologia no HEPQ JURUJUBA”, nele tivemos a oportunidade de estudar os livros que dispúnhamos naquela época, tais como:  Psicoterapia Centrada no Cliente (edição em espanhol – Editora Paidos de 1969), Tornar-se Pessoa ( Editora Moraes- Lisboa-1970 ), Liberdade para Aprender (Interlivros-MG-1971), Psicoterapia e Relações Humanas –teoria e pratica da terapia não diretiva- Editora Alfaguara- Madri-Barcelona-1971) , Ludoterapia (Virginia Mae Axline – Interlivros-MG-1972).

Além dessa bibliografia, estudada exaustivamente por nosso grupo, composto de psicólogos, orientadores educacionais, médicos e filósofos, tivemos o prazer e a honra, após enviarmos alguns documentos para Centro de Psicologia da Pessoa, em La Jolla, Califórnia, para o próprio Rogers, de recebermos vários artigos escritos por ele naquela época. ( Anexos, 1,2,3 e 4)

Além disso, recebemos também algumas correspondências nas quais ele nos incentivava e aplaudia nosso interesse por seu trabalho.

Estávamos entusiasmadíssimos com tudo aquilo que acontecia com nosso grupo de estudos. Sentíamos que era uma conquista de todos nós.

Ao mesmo tempo, e paralelamente ao grupo de estudos do consultório, havia em vários ambientes acadêmicos e institucionais,  um movimento muito intenso de estudo e prática das teorias rogeriana, e isso se podia ver através dos fatos que lhes descreverei a seguir.

Em 1971, quando ainda meus sócios estavam trabalhando comigo, no primeiro consultório que tive, um deles era amigo de um senhor presidente do conselho de pais do Centro Educacional de Niteroi (CEN), uma escola experimental ligada a Fundacao Brasileira de Educacao.

Nessa instituição haveria um treinamento para todos os professores no segundo semestre daquele ano.  Meu sócio foi indicado para realizar esse trabalho, mas considerou que seria uma tarefa muito grande para realiza-la sozinho e me convidou a dividir aquele compromisso com ele. Assim fizemos. A proposta era ministrar um curso sobre Psicologia da Adolescência.

O trabalho realizado por ele seguiu o padrão de um curso, o meu foi, na realidade, no formato grupo de encontro.

Em decorrência do que fiz ali, houve uma grande aceitação por parte dos professores que participaram dos encontros facilitados por mim, e esse grupo de profissionais sugeriu à Direção dessa escola minha contratação para atuar como psicólogo na unidade que seria inaugurada no ano seguinte, destinada a crianças pequenas (pré-escola). Em marco de 1972 iniciei meu trabalho como psicólogo no CEN e lá permaneci até novembro de 1995. Nesse período de 23 anos estive sempre envolvido em treinamentos de professores e de outros funcionários. A metodologia usada, sempre, era a dos grupos de encontro.

Dois dos trabalhos realizados ali foram marcantes por sua extensão e profundidade. Sobre eles foram publicados dois documentos que poderão ser lidos em meu site:

http://jlbelas.psc.br/2015/06/11/psicologia-escolar-saber-poder/
http://jlbelas.psc.br/2011/06/07/psicologia-escolar-relaxamento-meditacao-e-tecnicas-de-sensibilizacao-na/

No primeiro documento, link 1, mostro um trabalho que foi feito com um grupo de Funcionários  que trabalhavam na área externa do colégio e no refeitório. Denominei esses profissionais de  Auxiliares de Educação, por não serem professores mas pessoas muito próximas dos alunos e que mantinham naturalmente um relacionamento diário com eles.

No segundo, link 2, apresento um relato sobre uma atividade desenvolvida com alunos entre 3 e 5 anos, por duas professoras que foram supervisionadas por mim e participantes de um grupo de treinamento organizado para um grupo maior de profissionais que trabalhava com crianças desta faixa etária , nesse mesmo colégio.

Ainda nessa instituição, pude participar como facilitador em grupos grandes compostos por todos os professores que ali atuavam.

Ainda no ano de 1972 fui contratado pela Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro e lotado no hospital onde estive como estagiário durante três anos (de 1967 a 1970) e depois, como psicólogo voluntário,  de 1970 até 1972.

A partir de minha chegada ao Hospital de Jurujuba, na condição de Psicólogo, comecei  a organizar um setor que veio a ser, mais tarde, o Serviço de Psicologia do Hospital de Jurujuba e, nele, criei um estágio supervisionado por mim no qual os alunos de Psicologia poderiam passar dois anos, ou mais, estudando a teoria rogeriana e sua aplicação no atendimento clínico à uma população “normal” e também sua aplicação no tratamento de pacientes psiquiátricos ali internados.

Esse tipo de estágio não era remunerado.  Participando desse estágio, os estudantes, todos já no final de seus cursos, ou com seus cursos já concluídos, teriam a oportunidade de vivenciar atendimentos a pacientes internados, pacientes de ambulatório, suas famílias, funcionários do hospital e pessoas da comunidade externa.

Acorriam a esse estágio alunos provenientes de diversas instituições que formavam psicólogos, em Niterói e no Rio de Janeiro. Tivemos alunos da PUC, da Santa Úrsula, da antiga UERJ (UEG), da UFRJ, da Maria Thereza, da Gama Filho, UFF, etc. No total, passaram por lá mais de 60 estagiários.

2- A VINDA DE ROGERS AO BRASIL EM 1977

Em 1976, quando “respirávamos” e “bebíamos” as ideias de Rogers, recebemos a grata notícia de sua provável vinda ao Brasil no início do ano de 1977.

Alguns encontros preparatórios foram realizados pelos organizadores desse evento.

Participei, com outros componentes do nosso grupo de estudos, de um desses encontros que ocorreu em Niterói, organizado pelo psicólogo Eduardo Bandeira que, naquela época, era como um fio condutor que ligava os brasileiros interessados na teoria rogeriana ao próprio Rogers.

Foi também, o Bandeira, um dos organizadores dos grandes encontros desse psicólogo americano com os brasileiros.  Aqui no Estado do Rio, foram realizados dois grandes eventos: o Encontro no Hotel Nacional (em São Conrado)e o Workshop de Arcozelo( no Município de Miguel Pereira). Nessas atividades eu, Guilherme Magalhães e Eleanora Benedetti estivemos presentes. Nós três participávamos do grupo de estudos que era realizado no meu consultório.

3- O WORKSHOP DE ARCOZELO EM FEVEREIRO DE 1977

Passamos lá duas semanas inteiras. Havia, na parte da manhã um grupão do qual toda a comunidade que compunha o WS poderia participar e ali eram combinadas as atividades que seriam realizadas naquele dia, ou naquela semana… Era um momento de muitas trocas de informações entre as pessoas que ali estavam, mas  o instante mais esperado era aquele quando Rogers sentava, diante do grupo postado nas escadarias do anfiteatro ao ar livre que havia na Aldeia. Ali aconteciam os encontros de Rogers com o grupão.

O lugar era bastante acolhedor e gerava em mim, e possivelmente em muitos que ali estavam, uma sensação meio mágica difícil de se explicar.

“Cobriam’ esse anfiteatro, longos ramos de uma árvore – “Fícus Benjamin” – com aparência de ter nascido há muitas décadas.

Nos degraus desse anfiteatro, as almofadas coloridas, muitas delas levadas pelos próprios participantes, faziam do momento algo agradavelmente misterioso e de beleza inesperada.

Pessoas, mais de duzentas, ali reunidas, atentas, ouvindo as respostas que Rogers, paciente e gentilmente, dava às perguntas a ele dirigidas.

O clima de liberdade era sentido, ali, de maneira sutil.    Podíamos usar o tempo e o espaço como se tudo a nós pertencesse, sem nos sentirmos donos de nada.

Durante o período do WS, alguns participantes saíram da Aldeia para conhecer as redondezas, tomar banho nas cachoeiras que existiam por ali, usar a piscina da Aldeia, ou realizar qualquer outra atividade.  Mas, o interessante é que o grupo parecia não se dissolver, mesmo quando nos afastávamos uns dos outros, ou até quando saiamos para explorar os locais próximos.

Muitas questões e situações difíceis e complicadas foram vividas por todos que estiveram em Arcozelo em 1977.

Comumente em reuniões de grupo (280 participantes) as diferenças individuais em determinado momento se mostram e, nesses momentos, surgem situações difíceis de serem contornadas.   Todavia, ficou claro que ao término do WS tudo havia sido bem equacionado e, sem dúvida, acrescentado a todos nós muitas vivências e aprendizados.

Uma das experiências mais significativas, para mim, desse evento foi a possibilidade de participar de um grupo de encontro composto por cerca de 20 pessoas, não me lembro exatamente de quantas ele era composto, que se reuniu durante  12 dias seguidos, na parte da tarde. Os facilitadores foram Dario Oliveira e Rachel Rosenberg. As pessoas que participaram dessa experiência residiam em lugares diversos, de várias partes do Brasil. Realmente foi um aprendizado pra vida toda e me deu mais entusiasmo e mais segurança para, ao voltar de Arcozelo, iniciar a realização de vários grupos, sobre os quais falarei a seguir.

Uma experiência muito rica.  Uma vivência inesquecível.

4- GRUPOS DE JOVENS (GRUPOS DE UM DIA) E GRUPOS DE CASAIS (FINS DE SEMANA)

4.1- GRUPO DE JOVENS

Ao retornar de Arcozelo, minha vontade era realizar logo um grupo. Isso não ocorreu de imediato, mas não demorou muito.

Nessa época eu atendia vários jovens em meu consultório. Perguntei a eles se gostariam de participar de uma experiência em grupo. Imediatamente concordaram e começamos as sessões.

Nesse primeiro grupo surgiu a ideia de fazermos um outro tipo de vivência. Esta seria muito mais próxima de um workshop. E assim fizemos.

Uma amiga nossa, possuía um sítio localizado numa área a meia distância do centro de nossa cidade. Essa propriedade era pequena. mas possuía uma casa com uma boa sala, uma cozinha, banheiro , uma varanda e um quintal muito simpático, gramado, árvores frutíferas, rede de vôlei e um pequeno riacho que passava pelo terreno.

Era tudo o que precisávamos para a realização do nosso encontro. O local já estava definido.

Mas, precisávamos organizar mais alguns detalhes. Isso foi feito pelos jovens nos encontros preliminares ao WS. Foi combinado o seguinte:

a- Começaríamos a nos organizar às 6h da manhã ( hora para nos encontrarmos no local onde embarcaríamos);

b-Iríamos em 2 carros e neles arrumaríamos as bagagens que seriam utilizadas pelo grupo;

c- As bagagens : levaríamos almofadas, comidas, bebidas (água e refrigerante), talheres, copos, bola de vôlei, biscoitos…. enfim tudo aquilo que cada um achou interessante de ter para ser consumido durante o encontro;

d- Alguns foram com condução própria ( pais levaram até o sítio), mas não poderiam chegar após as 7h. Se isso acontecesse, aquele participante não poderia entrar;

e) O horário marcado para o término do WS foi às 18 h e até essa hora nenhum participante poderia sair do grupo, ir para casa, a não ser em situações extremas;
f) Alguns participantes resolveram fazer comida (arroz, macarrão, sanduiche quente, salada, salsicha…). Eles então levaram o necessário para processar esses alimentos e combinaram a cargo de quem ficariam essas tarefas.
g) O grupo seria composto por 12 jovens de idades que variavam de 18 a 22 anos.

COMO O GRUPO FUNCIONOU?

Por volta das 8 horas da manhã, tudo já estava arrumado no ambiente onde realizamos o encontro.

Todos sentados na grama, em círculo e…um belo silêncio.      Olhares surpresos, inquietação na postura física de alguns deles, sorrisos amarelos, olhares que não focavam em nada em especial, alguns mais tímidos estavam corados, outros valentões, amarelados…

Eles começavam a sentir que algo diferente estava acontecendo. Havia no ar uma pergunta que não ousava ser feita :  E agora? O que fazer? Como devemos proceder?

Essas perguntas veladas, que ficavam patentes nos silêncios e olhares que se cruzavam no espaço entre os participantes, como raios de um círculo, eram como flechas dirigidas aos outros e principalmente ao facilitador do grupo, no caso eu.

Minha “não reação” os incomodava , mas ao mesmo tempo gerava no grupo uma energia sutil e eficaz que, aos poucos foi sendo percebida e valorizada por eles.

Os jovens começaram a sentir que estava nas mãos deles a dinâmica do encontro e começaram a falar sobre o que estavam sentindo e propondo algumas ações bem objetivas para continuarem aquele “estar ali”.

Algumas sugestões foram aceitas pela maioria, outras não. Mas, o que se viu foi o início, com muita cautela, de uma conversa mais “profunda” que não chegou a mobilizar nenhum tipo de emoção mais forte nos participantes.

Em certo momento, resolveram brincar. Logo depois voltaram a se concentrar em “temas sérios”, de interesse das pessoas daquela idade. Esse primeiro módulo, durou cerca de 4 horas, ou seja: até as 12 horas.

Foi feita uma interrupção para o “almoço” que ficou pronto às 13horas. Nesse  intervalo de tempo, os participantes não comprometidos com a cozinha, ajudaram a arrumar o local da refeição, e tiveram tempo também para jogar vôlei.

Às 14 horas, todos voltaram a se reunir num grande círculo.  Aí já tinham uma série de assuntos que brotaram nessas primeiras 8 horas de convivência. Poderíamos dizer que os temas foram bem mais profundos do que os que surgiram na parte da manhã.

A reunião começada às 14 terminou às 16horas, quando se fez um intervalo para um lanche.

Às16:30 retornamos a nos reunir em grupo e isso terminou às 17:30.

Começamos após isso a nos prepararmos para terminar o trabalho e voltarmos para nossas casas.

Primeiro Grupo de Encontro de Jovens

Gráfico das atividades e níveis de tensão no encontro

Uma observação interessante e importante que se vê através deste gráfico, é que ele mostra o movimento que ocorre em praticamente todos os grupos deste tipo.

Tal fato, observado nos vários grupos que realizei depois deste, e mantendo este mesmo modelo, nos sugere que , ao iniciar o ws, o grau de tensão é bem baixo.  Esse nível cresce com o passar do tempo, com o desenvolvimento do grupo. Chega ao seu nível maior na segunda parte en no finaln ele volta progressivamente a cair, como se houvesse uma “sabedoria” interna no grupo.

Os participantes não voltam para casa vivenciando o grau mais elevado da tensão experimentado no ws. É como se eles tivessem permitido viver a emoção extrema durante o grupo, quando conquistaram uma confiança maior em seus participantes. Depois eles diminuem essa “permissão” para retornarem a um estado de equilíbrio interno mais suportável e que lhes será útil na vida “fora do grupo”, sem a “proteção” dele.

4.2- GRUPOS DE CASAIS (FINAIS DE SEMANA)

Embora a dinâmica dos grupos de casais seja naturalmente diferente daquela que se observa no trabalho com os jovens, como foi escrito acima, é muito interessante registrar que há um movimento semelhante nos dois.

Um dos grupos de casais, sobre o qual tentarei relatar aqui, era composto por 6 casais. A maioria dos participantes era de clientes meus do consultório. Um deles possuía uma casa muito confortável e ampla em um município vizinho a Niterói onde está localizado o consultório no qual eu os atendo.

O esquema montado foi semelhante ao que já usava no encontro de jovens. A diferença foi o tempo de sua realização. Começamos numa sexta-feira à noite, quando todos foram apresentados, uns aos outros e combinada a agenda para o dia seguinte.

Eu fui o único facilitador e terminamos nosso ws no domingo. no início da noite.

Indiscutivelmente, do mesmo modo que cada cliente em atendimento individual é único em suas histórias e no modo como ele as vivencia, podemos afirmar também que cada grupo é único na sua dinâmica e história. Entretanto há algo que acontece com enorme constância no trabalho com grupos: neles se observa um mesmo padrão de curva, sobre a qual falei em 4.1

Neste grupo que tomei como exemplo observamos o seguinte : o máximo de profundidade  dos temas discutidos ocorreu na parte da manhã de domingo, possivelmente depois que o grupo se recolheu para dormir e teve oportunidade de processar as questões levantadas durante o sábado à tarde/noite.

No domingo à tarde até quase a hora de todos irem para suas casas, houve um “esfriamento” da tensão. Os temas ficaram mais amenos e as pessoas mais amistosas entre elas.

Transpus um das experiências vividas por mim em Arcozelo para esse encontro de casais.

Tendo eles discutido as dificuldades mais importantes e frequentes em seus relacionamentos conjugais, solicitei que os maridos se reunissem e o mesmo pedi às esposas. Eles pensaram o que sentiam em relação aos temas que foram levantados na véspera e procuraram reunir as queixas que tinham em relação às atitudes delas para com eles.  As esposas fizeram a mesma coisa em relação aos seus maridos. Depois de algum tempo reunidos, os dois grupos (o dos maridos e o das esposas) se reuniram para “apresentarem o relatório que haviam feito”.

Essa dinâmica dos subgrupos, maridos e esposas, foi muito interessante e deu margem a diversas “descobertas”, a partir do momento em que cada um desses subgrupos revelou para o outro suas “queixas” e seus “elogios”. Dessa forma, anonimamente, cada casal pode perceber várias situações do dia a dia que prejudicavam, ou que melhoravam, a qualidade do relacionamento entre eles.

5 – OS GRUPOS DE CRIANÇAS E OS MATERIAIS UTILIZADOS POR ELAS

Em meados da década de 1980, eu trabalhava em um consultório que dispunha de 3 ambientes para atendimento psicoterápico.  Um deles era para atendimento individual, os outros para atendimento em grupo. Um desses, de grupo, era basicamente usado para o atendimento de adultos e jovens, e o outro para o atendimento de crianças.

Nessa época eu tinha um número grande de crianças em atendimento individual e propus aos seus pais  a composição de um grupo de terapia, o que de imediato foi aceito.

A sala na qual nos reuníamos com as crianças era preparada especialmente para esse fim, desde os móveis até a decoração.

O piso era pintado de epóxi na cor branca. As paredes, também eram pintadas com esse mesmo  tipo de material e, sobre elas, havia alguns painéis feitos de placas de aglomerado, revestidos de feltro de diversas cores.

Sobre essas placas coloridas as crianças podiam fixar seus desenhos e pinturas. Havia ali dois cavaletes e tintas laváveis à vontade.

A mesa era revestida de fórmica e a pia da sala era  de aço inox.  Tudo foi feito sob medida e adequado ao tamanho das crianças que seriam atendidas naquele espaço.

Brinquedos de vários tipos eram postos a disposição das crianças, como costuma acontecer em trabalhos com esses jovens clientes. Realmente incrível como ”a coisa mais séria que uma criança faz é brincar”. Através de suas brincadeiras temos mais possibilidades de penetramos no mundo delas, conhece-lo, compreende-lo.

Bem, vocês podem ter uma pequena ideia do que era trabalhar com meus pequenos clientes nesse ambiente especial que eu lhe proporcionava.  Todavia, uma das coisas mais curiosas que aprendi através desse trabalho com elas foi como o mundo desses pequenos e fantásticos seres é muito mais rico do que o nosso, de adulto.

Como falei linhas atrás, havia muitos brinquedos, comprados por mim com rigor em suas escolhas: os melhores brinquedos que poderiam ajudar aqueles meninos e meninas a criarem histórias ricas e produtivas para a terapia deles. Não imaginava que, um dos materiais sobre os quais eu não lançava nenhuma expectativa, pois não acreditava que nos pudesse realmente ser útil, era o que mais enriquecia a história de cada criança do grupo, e do grupo como um todo.

Mas que material era esse?

Certo dia, estando eu na casa de um amigo muito habilidoso no trato com madeiras, com as quais construía objetos fantásticos, ele me convidou para irmos a uma serraria, que ficava perto de sua casa, para comprar algumas      peças de madeira que ele precisava para fazer alguns trabalhos. Fui com ele.

Chegando lá, vi que havia muitas sobras de madeiras, jogadas num canto, de vários tamanhos e formas.  Achei interessante e pensei: vou comprar algumas dessas para levar para as crianças do grupo do consultório.

Quando perguntei ao dono da serraria por quanto ele me venderia aquele material, ele riu e me disse:

“Pode levar o que quiser, pois tudo isso irá para o fogo. É sobra, e não serve pra nada!”

Uau!!! Imediatamente juntei uma porção daqueles recortes e coloquei no carro. Chegando na oficina do meu amigo, aparei as farpas e lixei as peças. Levei para o consultório. Pensei em pintá-las. Não fiz isso. Deixei exatamente a madeira original, com seus diversos tons e texturas.

Para minha surpresa, esse foi o material mais amado pelas crianças. Com ele elas criaram cidades, casas, animais, parques, fazendas, pessoas… Um universo que só elas viam e nos quais podiam viver suas maravilhosas e às vezes profundas e doloridas histórias.

As crianças desses grupos tinham idades que iam de 8 a 11 anos. O tempo de duração foi de aproximadamente 5 meses.    Algumas, depois dessa experiência continuaram seus atendimentos individuais, outras não.

Um fato curioso que aconteceu em um desses grupos foi o seguinte:

O grupo era composto de 7 meninos. Apenas um deles era já atendido por mim em terapia individual há alguns meses. O local, onde seria realizado o grupo era, como já mencionei acima, branco, branco, branco. Chão, paredes…

No primeiro encontro desse grupo de meninos, um deles olhou ao redor, obviamente viu que quase tudo era branco, e perguntou pra mim:

– O que a gente pode fazer aqui???

Imediatamente o menino que já era atendido ali, naquele espaço, respondeu:

– TUDO, CARA!! TUUUDOOO!!

Esse menino que deu a resposta estava dizendo, ou antecipando para o outro,  que ele poderia fazer o que quisesse. Caso surgisse algo não permitido ele saberia no momento certo.

Através dessa resposta, ficava bem claro que esse menino havia experimentado o verdadeiro sentido da palavra liberdade, ali, naquele espaço de aceitação, mas também de limites muito claros que seriam colocados por mim no momento adequado, nem antes, nem depois.

6 – GRUPOS DE PACIENTES INTERNADOS

( TEMPO+ESPAÇO = FENOMENO TERATÊUTICO ? )

Agora vamos falar sobre um grupo muito especial realizado no Hospital Estadual Psiquiátrico no ano de 1983-84.

Ele surgiu após uma reunião com os estagiários desse hospital na qual levantei para eles uma questão. Tratava-se de uma hipótese que, para mim, seria facilmente comprovada na prática.

Disse para eles o seguinte: “se nós pudermos controlar duas variáveis ao se trabalhar com um grupo, ocorrerá ali um movimento natural rumo ao qual podemos chamar de movimento terapêutico, ou se quisermos dar outro nome, de crescimento do  grupo e de seus participantes.”

Com a hipótese acima lançada, eu estava radicalizando algo muito próprio e típico dos Grupos de Encontro: todo grupo, se dermos a ele condições favoráveis, ele caminhará em direção ao seu crescimento, medido por seu grau de organização progressivo.

Uma das estagiárias aceitou participar dessa experiência a qual teria como base a vivência das condições mínimas e necessárias para que um processo terapêutico seja posto em marcha, segundo a Abordagem Centrada Na Pessoa, proposta por Carl R. Rogers.

Em outras palavras: uma vez estando no grupo, tentaríamos ser o mais congruentes, empáticos e aceitadores incondicionais em relação a tudo o que viesse a acontecer ao longo dos nossos encontros.

Na tentativa de radicalizar ainda mais a experiência, não selecionamos os pacientes que participariam dela. Apenas colocamos sob controle três variáveis: 1-o local onde nos encontraríamos; 2- o dia da semana no qual haveria o encontro; 3- o tempo no qual estaríamos com aqueles pacientes.

O local – o pátio interno coberto da ala masculina;

O dia da semana – às quartas-feiras;

O horário – das 9 às 10 da manhã.

A dinâmica dos encontros:

Durante um período de aproximadamente 3 meses, eu e a estagiária íamos às 4ª.feiras para o pátio às 9 horas. Lá, sentávamos a uma distância suficiente para que eles percebessem que eu e ela estávamos juntos, ali.

Nesse pátio, os pacientes circulavam livremente, podendo transitar pelos corredores que davam acesso às enfermarias dessa ala.  Assim sendo, eles podiam entrar e sair daquele espaço quando bem entendessem. Só permaneceriam ali se assim desejassem.

No primeiro dia, provavelmente eles acharam o nosso comportamento meio estranho, pois não era costume alguém do corpo clínico do hospital ir lá, ficar sentado no chão cimentado,  como eu a minha estagiária ficávamos.

Aos poucos, a cada 4ª feira, os pacientes foram se chegando, curiosos, ficando mais próximos de nós e, para variar, começaram a solicitar suas altas. Nossa reação era apenas  conversar com eles, normalmente, tentando interagir de forma empática, aceitadora…

Levávamos conosco alguns papéis e lápis de cor. Eles pediam e faziam seus desenhos ali mesmo, acostumados que estavam nas atividades do setor de terapia ocupacional desse hospital.  Faziam seus desenhos e mostravam para nós, e para os demais que ali estavam, suas obras.

Inicialmente o número de pacientes que se ligou a nós, como um grupo, era pequeno. Aquele local, geralmente, era frequentado por número grande de pacientes crônicos que nem falavam e, quando “falavam” , seus discursos não eram compreensíveis. O que se via naquele lugar eram pessoas alienadas de quase tudo, sem vínculos com os que passavam por ela num caminhar errático, sem propósito, a não ser o de não permanecer parado. Muitos delirantes, outros catatônicos, outros agitados…

O tempo foi passando, o número de pacientes foi aumentando e se tornando mais previsível quem participava realmente do grupo e quem só ia lá “de passagem”.

O que se observou foi muito interessante e confirmava a hipótese inicial:  mantendo tempo e espaço sob controle, surgiria um movimento rumo ao despertar de um fenômeno que seria o da criação espontânea de um grupo com potencial terapêutico.

Realmente o que se observou, depois de algum tempo no qual observamos o controle dessas duas variáveis, foi o surgimento de um grupo.

O estar ali, naquele dia e horário,  ganhou um sentido maior. Inicialmente havia uma dispersão que, aos poucos, foi dando lugar a uma fusão e integração, mesmo entre pacientes bem regredidos e de período longo de internação.

Dois pacientes nos chamaram muito atenção: ambos eram muito regredidos com comportamentos compatíveis com seus níveis de doença. Ambos tinham mais de 40 anos.

Um deles vivia completamente nu, não aceitando nenhuma vestimenta, tal como uma criança muito pequena. Sua fala era somente um som repetido sem que se formasse sequer uma sílaba.      Poderíamos dizer que era semelhante a anterior ao balbucio.   Sua postura curvada, seus dentes apodrecidos, e muitos deles já não existiam, tornava-lhe difícil conter a saliva na boca.

Nada do que falava era compreensível.

Essa criaturinha, desajeitada, que ao andar se contorcia toda, como se ainda estivesse aprendendo o que fazer com suas finas pernas, braços, tronco e cabeça, surpreendeu-nos ao se mostrar firme, seguro, estético, suave ao nos ver fazendo, em uma das reuniões, alguns exercícios de tai-chi-chuan.

O dia era meio monótono e o grupo acompanhava essa atmosfera do ambiente. Estávamos, eu e a estagiária, sentados como sempre, no chão, quando, não sei por qual motivo, me levantei e comecei a fazer o meu tai-chi-chuan.

Ela, que também praticava essa arte, me acompanhou.  Nossos movimentos lentos, chamaram a atenção dos pacientes que estavam por ali, naquele dia mais dispersos, e alguns começaram a nos imitar.   Alguns até levavam jeito pra coisa, mas outros, absolutamente não.

Nossa surpresa, imensa surpresa, teve inicio quando vimos o “mais regredido do grupo”, o paciente ao qual nos referimos acima, começar a nos imitar com uma leveza, um sincronismo em seus movimentos que não “fazia sentido”. Como aquela pessoa, a mais desengonçada, a que não apresenta nenhuma postura ao andar, conseguia fazer aquilo????? E ele  ria como se experimentasse o gozo da liberdade. E seu sorriso nos contagiava como se ele nos fizesse lembrar do sorriso de uma criança, inocente que se encanta com o novo que descobre haver em seu mundo.

O outro paciente, desse mesmo grupo, também não falava e tinha como hábito comer fezes. Quase ninguém gostava de ficar perto dele pelos motivos que podemos bem entender. Eventualmente também se negava a se vestir e não falava, apenas balbuciava algumas sílabas. Era muito inquieto e vivia andando de um lado para o outro em movimentos rápidos, aparentemente sem se dar conta do que acontecia ao seu redor. O tai-chi não foi sua fonte de revelação, mas sim o seu ficar sentado por vários minutos durante a reunião do grupo. Havia, tudo indica, um encantamento no que via à sua frente. Pessoas sentadas, que formavam um círculo e, dentro dessa roda feita de gente, a paz, a harmonia. Tudo aquilo que ele parecia precisar para se sentir, para ser, par achar seu espaço.

Sobre este paciente escrevi um texto que se encontra em

Cabe acrescentar também, para fecharmos esse tema, os grupos aconteciam naturalmente a partir do momento em que eu e estagiária sentávamos no chão do pátio. Eles ficavam ao nosso redor e, de forma espontânea, acabavam formando um círculo.

Posso crer que, por estarmos ali em espaços de tempo regulares, um grupo naturalmente surgiu.  Ele se foi formando aos poucos em um espaço que não foi criado para tal finalidade.

Os pacientes, após algumas reuniões nossas com eles, começaram a perceber quando (tempo) e onde (espaço) aconteceriam os nossos encontros.

Cabe aqui lembrar que geralmente, em um hospital desse gênero, e pelas características dos quadros clínicos tratados ali, a noção de tempo e de espaço nem sempre são facilmente processados pelos pacientes. Isso também nos chamou atenção. Eles sabiam quando iam se encontrar, onde e a que horas.

Observamos uma melhora na interação dos pacientes, pois muitos que viviam isolados começaram a descobrir a existência do outro perto deles e passaram a se comunicar com maior intensidade, principalmente quando, ao terem feito algum tipo de desenho com o lápis cera, mostravam para o outro o que haviam realizado. Surgia ali uma troca inicial de comunicações entre eles, e deles conosco.

7- GRUPO DOS ESTAGIÁRIOS DO HEPQ-LUMIAR -RJ

O estágio em clínica psiquiátrica foi criado em 1972. Ganhou forma em 1973 e, progressivamente, foi sendo melhorado em vários pontos: o tempo foi estabelecido como sendo de dois anos e os estagiários, todos, passavam por uma seleção e precisavam estar no último ano, ou semestre, ou ainda já ser formado. Havia um programa bem definido programado para esse período em que o estudante, ou recém-formado, faria sua residência. No programa de treinamento havia um item que era a vivência em um trabalho em grupo.

No ano de 1984, o grupo de estagiários era composto por 13 participantes, oriundos de diversas faculdades de Niterói e Rio de Janeiro.

Seguindo a programação, foi realizado com eles um grupo de encontro especial  fora da cidade de Niterói, em Lumiar, um bairro pertencente ao município de Friburgo-RJ.

Como a realização desse encontro seria em lugar mais distante, e como faríamos um grupo com duração de 12 horas, aproximadamente, foi necessária a criação de um esquema adequado aos nossos objetivos.

O grupo saiu bem cedo de Niterói, com o objetivo de chegar aproximadamente entre 8 horas e 9 horas da manhã de um sábado.

O local foi uma simpática casinha situada em um terreno plano, gramado no centro do qual corria um riacho. Havia uma sala, um banheiro e uma cozinha amplos o suficiente para o número de participantes.

Muitos deles não se conheciam o suficiente para que pudéssemos afirmar que eram “amigos”. No máximo, colegas.

Minha intenção era, através dessa vivência, ajuda-los a serem mais próximos, se conhecerem melhor e mais profundamente.

Com esse objetivo, imaginei que pudéssemos testar uma hipótese que já vinha amadurecendo em minha cabeça. Foi ali que nasceu o Método de Recapitulação Progressiva da História Pessoal, sobre o qual já escrevi e que, mais tarde, veio a ser o tema do meu trabalho de conclusão do curso de especialização em clínica institucional, feito na UFF.

Em rápidas palavras, tentarei descrever o que foi feito nesse grupo, embora naquela ocasião ainda de modo embrionário, e que foi depois aperfeiçoado dando origem ao surgimento do método RPHP.

Dividi o tempo que dispúnhamos em três partes. Uma na parte da manhã, a segunda na parte da tarde e a última  realizamos do final da tarde até o início da noite.

Na parte da manhã tivemos dois momentos distintos, como se fossem subdivisões. No primeiro, foi feito um relaxamento físico e após isso solicitado a cada participante que tentasse focalizar o período mais antigo de sua infância.  Eles ficavam ali, mergulhados em suas buscas de lembranças desse período inicial de suas vidas. Poderiam percorrer um período do nascimento até a pré-adolescência. Não deveriam explorar além desse tempo vivido.

Em um estado de relaxamento, reviviam suas lembranças e, após alguns minutos , solicitava que desenhassem,  o que lembraram, em uma folha de papel que já se encontrava à frente de cada um.  Podiam escrever, se preferissem, tudo o que lhes veio à lembrança.

Feito isso, deveriam colocar as folhas com os registros que haviam realizado sobre o chão, com os dados voltados para baixo, e novamente voltarem ao estado de relaxamento. Uma vez todos já acomodados e relaxados, pedi que agora tentassem se lembrar das experiências vividas até aproximadamente 21 anos.

Repetimos as mesmas ações do inicio, ou seja, pedi que desenhassem ou escrevesse, ou as duas coisas, agora sobre o período sobre os quais buscaram suas lembranças, da adolescência até o início da idade adulta,

Após desenharem, solicitei que cada um apresentasse os seus dois desenhos, ou escritos, feitos até aquele momento. E que tentassem explicar para os colegas o que representaram ali e que respondessem às dúvidas que os outros viessem a ter sobre o que ele havia mostrado para o grupo.   Todos fizeram isso.

Depois desta primeira parte, fizemos um intervalo para uma refeição.

Durante o “almoço” já se observava um clima diferente entre eles. Havia mais proximidade como se eles já se conhecessem de longa data, desde a infância de cada um ali presente.

Depois do almoço, realizamos a terceira parte dessa recapitulação. Usando a mesma dinâmica da parte da manhã, foi solicitado ao grupo que tentasse focalizar as lembranças dos fatos que ocorreram após 21 anos de idade.  Para a maior parte dos participantes, na realidade era praticamente o “atual” na vida deles.

Finalizando a parte da tarde, pudemos ouvir as histórias de vida de cada componente do grupo. Ouvimos seus medos, suas alegrias, seus ressentimentos, suas conquistas, seus modos de ver a vida e a profissão que escolheram abraçar.

O resultado foi além do esperado. Os objetivos de ajudá-los a se conhecer e se integrar mais,foram alcançados.

Após um rápido café, retornamos. À convite de uma das participantes desse encontro, que morava em Friburgo, antes de retornarmos à Niterói, passamos na casa dela, e ali foi realizada uma calorosa confraternização.

8- OS GRUPOS realizados entre 1978/1985

(A INFLUENCIA DE ARCOZELO)

Sem dúvida, Arcozelo foi um disparador no meu antigo gosto pelo trabalho em grupo. Antes desse grande ws, no qual conheci muitos profissionais e, mais do que isso, vivi a experiência de participar de vários tipos de grupos: o grupão das manhãs, o grupo menor à tarde, o grupo de homens ( que no encerramento dessa atividade trocou informações sobre os temas discutidos nele com o grupo das mulheres e esse, tal como fizeram o dos homens, falou sobre que elas discutiram no delas. Enfim, tudo o que aconteceu em Arcozelo, me motivou a realizar vários grupos de vários formatos.

Alguns deles, desenvolvidos no consultório, tinham como característica o seu tempo de duração.

A forma mais comum em grupos de terapia não determinava seu tempo de duração. A partir de minha observação relativamente ao “movimento dos grupos”, coisa que vinha percebendo há muito tempo, em muitos grupos, pensei que poderia ser produtivo criar um grupo com tempo pré-definido.  Acreditava que se os participantes do grupo percebessem que não teriam o tempo todo do mundo para começar a avançar em suas buscas interiores, talvez algo novo acontecesse na dinâmica das sessões.  Haveria uma pressão natural para utilizar melhor o tempo que disporia nesse trabalho.

Pensei que surgiria um movimento tal como ocorre nos grupos de um dia, ou naqueles realizados em um final de semana. As primeiras sessões talvez fossem bastante “frias”, mais próximas de um contato social, e , progressivamente passariam a ser mais íntimas  com discussões de temas mais significativos para os seus participantes. A curva seria igual, ou semelhante àquela que apresentei no ítem 4.1, deste documento.

Realizei vários grupos neste formato e posso afirmar a vocês que foram como eu esperava.

8-1 – Os grupos realizados em treinamento de professores

Os anos 1980 foram muito ricos em experiências de grupo. Citarei aqui dois que se destacaram. O primeiro na Escola Carolina Patricio, em São Conrado, Rio de Janeiro.  O segundo no Colegio Marilia Mattoso, em Niteroi. Ambos no Estado do Rio de Jan eiro.

Atuei no Carolina Patricio no treinamento de professores e nas discussões de casos de alunos/professsores e de questões ligadas  a escola/famílias. A atividade mais significativa, a meu ver, foi aquela em que estávamos fazendo a preparação dos professores para o inicio do ano letivo.

Usando a metodologia dos grupos de encontro, e a da RPH, constante deste documento, criamos condições para que os professores revissem suas historias pessoais focalizando o período de suas vidas quando eram estudantes muito pequenos em idade e o momento em que chegavam em suas escolas, naquele ambiente desconhecido para eles. O resultado foi muito interessante, pois com esse tipo de treinamento os professores ficaram muito mais sensibilizados e preparados para, ao receberem seus novos pequenos anos, compreenderem mais profundamente o que possivelmente estariam eles sentindo naquele mundo novo, desconhecido.

O segundo trabalho, no Marilia Mattoso, foi também um grupo que tinha como objetivo a aproximacao maior entre os professores no sentido afetivo e de reflexão mais profunda sobre o papel que desempenhavam como educadores na formação mais global de seus alunos, ou seja, não so conteudistica.

9 – PSICOTERAPIA INDIVIDUAL DE CLIENTES USANDO O MET. RPHP

9.1–Encontro Sudeste da ACP, em Itaipava – Petrópolis-RJ

(Apresentação do trabalho sobre o método RPHP)

Em junho de 1998, foi realizado um Encontro de Profissionais da Psicologia, interessados na ACP. Esse trabalho foi muito bem organizado e aconteceu nas dependências de um gostoso hotel na cidade serrana de Itaipava, um distrito do município de Petrópolis, no Estado do Rio de Janeiro.

Há alguns anos, antes desse acontecimento, já vinha usando o aperfeiçoamento daquele encontro sobre o qual lhes falei acima, quando descrevi o treinamento de um grupo de estagiários do hospital de Jurujuba, realizado em Lumiar, Friburgo, RJ. Lembram-se?   Pois é, passada mais de uma década e meia daquele encontro com os estagiários, e tendo aplicado essa metodologia em grupos do consultório e em atendimentos individuais, consegui juntar um bom número de informações e de documentos com os quais elaborei um trabalho e o apresentei nesse Encontro Sudeste de Itaipava.

Foi muito interessante o que aconteceu nessa ocasião, talvez por falha minha, ou talvez pela surpresa que esse documento possa ter provocado nas pessoas que lá estavam.  Tentarei explicar melhor o que quero aqui comentar e, quem sabe até , receber após a leitura deste documento, alguma observação de alguém possa ter estado lá e que ainda se lembre o que aconteceu pós apresentação do trabalho que foi por mim apresentado naquela ocasião.

Parece ter ficado meio estranho, alguém da ACP falar em aplicar um método de terapia. Talvez isso, naquela época, soasse como uma técnica. E técnica era uma palavra mal vista para os teóricos acadêmicos estudiosos dessa abordagem.  Posso até entender esse posicionamento de alguns profissionais zelosos que tentavam clarear o máximo possível alguns pontos da teoria rogeriana que ainda se mostrava meio confusa para muitos que a estudavam e a vivenciavam em suas práticas psicoterápicas.

Além dessa questão, a “técnica”, havia uma outra igualmente importante que era a ideia do “trabalhar o aqui e o agora”, ou seja abandonando um outra ideia que era a relação causa-efeito dentro do processo terapêutico.  Buscar o passado, conhecer “causas”, no mínimo ficava parecendo com a psicanálise, ou a terapia cognitiva, ou reflexologia. Coisas desse tipo, bastante distantes da proposta centrada na pessoa, como costuma ser vista.

Como disse linha acima, não creio que tenha havido uma rejeição ao trabalho por mim apresentado, mas, sim, um desencontro entre a realidade que quis apresentar e aquela que puderam perceber através da minha exposição.

Não sei se, até hoje, as pessoas ligadas a ACP conseguiram compreender o trabalho por mim desenvolvido, que era um misto de teoria sobre a terapia, matemática, probabilidade, disponibilidade do cliente para o trabalho, adequação dele ao método, desejo dele experimentar esse recurso que lhe era oferecido como opção, como uma ferramenta que talvez pudesse ajudá-lo a compreender melhor suas dificuldades, etc.

Existe um tipo de cliente que, a despeito de nossa disponibilidade para ouvi-lo, compreendê-lo, aceita-lo, estabelecer uma relação genuína, transparente, congruente, criando as melhores condições , como as preconizadas pela ACP, mesmo assim, ele tem imensa dificuldade para se compreender, para aceitar a si mesmo, a se libertar de uma série de percepções de si mesmo que se mostram sedimentadas, rígidas e que limitam sua caminhada na direção de uma “vida mais plena”.  Alguns desses clientes são pessoas criativas, inteligentes, sensíveis e que se mostram com habilidades favoráveis ao uso de Método de Recapitulação Progressiva da História Pessoal. Em algum momento do processo, quando percebo que esse recurso poderá ajudar aquele cliente a acelerar sua terapia, ofereço a ele tal possibilidade. Mostro a ele o que será realizado, toda a dinâmica do trabalho que poderemos desenvolver e submeto à apreciação dele e aguardo sua decisão. Caso ele queira tentar, ele marcará o dia em que o iniciaremos.

O terapeuta, quando o cliente resolve aceitar a proposta que lhe foi apresentada, continua mantendo sua postura, tal como era antes do início da aplicação do método, ele apenas ajuda seu cliente a utilizar esse recurso do modo como essa prática tem se mostrado mais produtivo.

O RPHP é um método que se baseia em um conceito fundamental, a meu ver na terapia centrada na pessoa, o Self:

“ uma estrutura perceptual, ou seja, um conjunto organizado e mutável de percepções referentes a uma pessoa. Como exemplo destas percepções, podemos citar: aquelas características, atributos, qualidade e defeitos, capacidade e limites, valores e relações que uma pessoa reconhece como descritivos de  si mesmo  e que percebe como dados de sua identidade. Esta estrutura perceptual faz parte, evidentemente – parte central – da estrutura perceptual total que engloba todas as experiências do sujeito em cada momento de sua existência.”(1- pag.34)

“ O self é parte inerente da unidade psicofísica total à qual denominamos  ´organismo`e, por conseguinte, sujeito a ação da ´tendência atualizante´” (1 pag.35)

“ A conjugação desses dois fatores – a tendência a atualização e a noção de eu (self) – determina o comportamento.” (1- pag. 35)

Ao estudarmos o self, verificamos que ele é construído ao longo da historia de vida de uma pessoa. Tal construção é altamente dinâmica e se dá através de percepções que a  pessoa  adquire sobre ela própria, vindas de fora dela ( o que as pessoas dizem sobre ela ) e as coisas que ela própria percebe em relação a si mesma.

O “self é a mola mestra que movimente comportamentos e atitudes de uma pessoa na sua relação com a realidade que a cerca, ou seja TUDO. Nem sempre essas experiências que acabaram fazendo parte da formação do self de uma pessoa é percebida de maneira clara por ela mesma. Algumas foram determinantes de grandes mudanças na autoimagem mas, por outro lado, não tão “figura” para serem mantida no campo mnêmico. Outras, foram igualmente importantes e fortes, mas profundamente dramáticas e sofreram um processo de “proteção da dor” e, por isso, ficaram “sabiamente esquecidas”. Todavia, nenhuma vivência passa desapercebida quando se fala em construção do self. Todas tem influência na sua construção, em sua organização e em sua dinâmica. Em outras palavras, costumo dizer que somos uma sucessão de fatos histórico, mas não somos o somatório deles, somos, sim, seu produto. Isso significa que numa sucessão de experiências vividas por uma pessoa, e chamarei aqui tais vivências de A, B, C, D, por exemplo, a vivência B contém A, deixa de ser apenas B e passa a ser AxB _ um produto da primeira modificada pela segunda _ e vice-versa; C contém AxB e passa a ser AxBxC, D contém AxBxCxD.

A experiência anterior modifica sempre a atual. E o aqui e agora é o produto, não a soma, de todos os momentos vividos por uma pessoa até aquele exato momento de sua vida.

Entender o aqui e agora é entender esse produto que vem sendo construído ao longo de sua vida. E, para entender esse produto é necessário, para algumas pessoas, que ela vivencie aquilo que costumo chamar de  “Autodesconstrução e Autorreconstrução de seu Self”. Através disso, geralmente lhe é dada a capacidade não só de compreender suas dificuldades e características atuais de comportamentos e atitudes, bem como aceitar tanto seus aspectos positivos como os negativos, por passar a compreender grande parte dos seus dos seus valores, de sua percepção do mundo e de si.

Esse método não é utilizado para aqueles clientes que, naturalmente caminham progressivamente em direção ao encontro de si mesmos, explorando seu modo de ser, compreendo e aceitando as novas percepções que, ao longo da terapia, têm deles mesmos. Ele é sugerido e apresentado àqueles clientes que demonstram grande dificuldade na caminhada em direção a si mesmos, não importando o que os está levando a isso. É apenas um método auxiliar.  Um recurso posto à sua disposição, plenamente controlado e dirigido pelo próprio cliente.

Sobre este método, maiores detalhes poderão ser encontrados no texto “Um método histórico e um  prática psicoterápica” e

“R.P.H.P Um estudo sobre o “self”: sua construção, desconstrução e Autorreconstrução”. Esses dois trabalhos poderão ser encontrados em www.jlbelas.psc.br na categoria : Pscoterapia- Teoria e Prática.

Uma experiência muito rica.  Uma vivência inesquecível.

Referência bibliográfica : (1) Rogers,C. & Kinget G.M –Psicoterapia Y Relaciones Humanas – Vol I –Edit. Alfaguara-Madrid-Barcelona-España

9-2- OS ATENDIMENTOS INDIVIDUAIS E EM GRUPO NO TRABALHO DE CONSULTÓRIO USANDO O Método RPHP

Um fato interessante sobre a aplicação desse método (RPHP) é que ele teve sua origem em um trabalho experimental de grupo, com alunos estagiários do Hospital Estadual Psiquiátrico de Jurujuba-Niterói, como já falamos acima ,neste documento.

Depois dessa vivência com os estagiários, comecei a desenvolver mais as ideias que me ajudaram a estruturar aquele trabalho que foi realizado em um único dia.

Senti que algo ocorrido ali, mais especificamente o resultado que obtivemos ao final daquele encontro, poderia conter um potencial terapêutico significativo.  Para isso, seria necessário organizar mais detalhadamente o processo e ampliá-lo para não mais um dia, mas para vários dias, ou seja em várias sessões.

A primeira coisa na qual pensei foi, em lugar de realizar um trabalho no qual a exploração da história individual abrangesse períodos longos de vida, como ocorreu no grupo dos estagiários, explorar etapas menores.   Mais ainda, considerando a importância dos primeiros anos da história de uma pessoa formação de seu SELF, decidi explorar essa etapa em 8 sessões. A primeira focalizaria o período que vai da concepção até o nascimento. A segunda, do nascimento até o final do primeiro ano de vida. A terceira do início do segundo ano de vida até o final desta idade. E assim sucessivamente até atingirmos o final do sétimo ano de vida, ou do oitavo (esta última possibilidade é explicada no texto no qual falo especificamente no método, e pode ser lido em www.jlbelas.psc.br ).

Esta passou a ser efetivamente a primeira etapa do processo: explorar, ano a ano, como o self do cliente foi sendo construído ao longo dos seus primeiros anos de vida, até seus sete anos de idade.

Pude constatar, após muitos atendimento utilizando esta metodologia, a importância enorme desse período de formação da personalidade de uma pessoa, a ponto de , em muitos casos, a exploração dessa fase ser quase “suficiente” para podermos compreender o modo como, hoje, o cliente se comporta, seus valores mais profundos, suas condutas mais marcantes…

Entusiasmado com os fatos que ia recolhendo , cada vez mais, a partir da utilização do RPHP, comecei a aplicar esse recurso em várias situações de terapia, individuais e em grupos.

Uma das experiência mais marcantes deu origem a um pequeno trabalho escrito sob o título “ A História e a Clínica “ (Aplicação do R.P.H.P. em um ambulatório de Saúde Mental da Rede Pública Municipal de Niterói-RJ)

Este grupo era identificado no local onde foi realizado como (GEE/1-97 – HPQ- Jurujuba-Niterói-RJ) era o nosso Grupo de Encontro Especial.

Na introdução desse trabalho escrevi:

“ Trata-se do estudo da História e principalmente da História Oral.

Sou um principiante no assunto.  A cada livro que descubro sobre este tema, sinto-me tomado de surpresa e de certa fascinação.

Considero que ainda tenha lido muito pouco sobre a História Oral e sobre a Nova História e o que desejo comunicar a vocês, através deste documento, é o modo como estou utilizando alguns achados meus nessa área do conhecimento em minha prática clínica.

A relação entre a psicoterapia, na sua dinâmica mais característica, ou seja, a compreensão da história do cliente, e a História é algo óbvio. Não é, pois, aí que reside o aspecto mais significativo da ligação entre esses dois campos de saberes.

O que tenho observado, tanto no trabalho de consultório como no ambulatório do Hospital Psiquiátrico, onde atuo como psicoterapeuta, são as consequências que acompanham o processo de recordação da história do cliente, principalmente quando tais lembranças ocorrem num contexto terapêutico com algumas características bem definidas.

Tentarei falar algumas coisas sobre esse contexto terapêutico e também como essa história da pessoa, uma vez reorganizada, leva o cliente a uma reorganização de seu “self” e de suas atitudes frente à realidade que está vivendo no presente.

Procurarei exemplificar o que estou dizendo através das avaliações dos participantes de um grupo de ambulatório na instituição pública em que trabalho.

Essa avaliação feita por eles nos mostra com clareza o quanto uma metodologia calcada na Recapitulação de História  de Pessoa parece possuir uma força terapêutica significativa e consegue, num tempo relativamente curto, promover alterações e reorganizações  construtivas na percepção que o cliente tem dele próprio e do mundo ao seu redor.

Como decorrência dessa reconstrução de sua realidade, seu comportamento também passa por um processo de reconstrução.  Tais mudanças se mostram, em todos os participantes desse grupo, de natureza construtiva, criativa e portanto apontando para os critérios mais aceitos pelos terapeutas experientes como melhora psicológica.”

Uma experiência muito rica.  Uma vivência inesquecível.

10– GRUPOS DO HOSPITAL COM PRAZOS DECRESCENTES 1985

A década de 1980 foi marcada, no serviço público estadual de saúde, no Rio de Janeiro, por mudanças muito curiosas e, por que não dizer, estranhas ao pensamento científico. O SUS começava a se fazer visível e ativo progressivamente e gerava reflexos na assistência à saúde e, no hospital onde eu atuava, não deixou de ser diferente.

Um fato inédito estava acontecendo naqueles anos. O hospital passava a ser avaliado e, além disso, os relatórios que deveriam ser apresentados ao SUS levavam a produtividade alcançada em cada mês pela instituição.

Acontece que, por exemplo, uma injeção aplicada representava um procedimento. Um curativo feito, idem.  Uma sessão de psicoterapia, idem.

Não posso afirmar, mas tudo levava a crer que o que importava, para o valor do recebimento de ajuda financeira, a ser dada ao hospital, dependeria do número de procedimentos, independentemente de sua natureza.

Em decorrência disso, como a psicoterapia ali praticada seguia o padrão para esse tipo de processo, ou seja: pelo menos uma sessão semanal com duração de 50 minutos cada uma, o valor recebido pelo Hospital para aplicar uma injeção era o mesmo que recebia por uma sessão de psicoterapia.

Certo dia, fui chamado à direção técnica e me perguntaram se haveria possibilidade de reduzir o tempo das sessões para 20 minutos (como falei acima, eram de 50 minutos). Minha resposta foi: “Tudo bem, desde que me treinem para isso, pois não sei fazer desta forma.” Desistiram da proposta.

Entretanto, essa situação fez-me pensar em alternativas para os meus atendimentos naquela instituição, e comecei a praticar, como alternativas, duas formas novas de atender.

Na primeira, estabelecia um número pré-determinado de sessões para os trabalhos com grupos. Por exemplo:

– Psicoterapia em grupo com 8 sessões (como já realizava no consultório) e com duração de uma hora cada uma.

Na segunda, realizava atendimentos individuais seguindo uma agenda flexível composta por quantidades de sessões progressivamente menores, com o passar do tempo. Este segundo formato seguia o seguinte esquema:

– 8 sessões ( uma a cada semana, durante 2 meses);

– 8 sessões ( uma a cada quinzena, durante 4 meses);

– 8 sessões ( uma a cada mês, durante 8 meses).

Neste segundo esquema, tempo total possível para o atendimento de um paciente seria, portanto, de 14 meses, o que representava estar conosco por um período de um ano e dois meses.

Esse período poderia ser prolongado, caso houvesse necessidade, ou reduzido, se o cliente se mostrasse em condições de interromper sua sequência de atendimentos, por ter melhorado concretamente, ou por outros motivos que pudessem justificar a parada de seu tratamento.

O hospital e o consultório sempre foram para mim dois campos de aprendizado e de troca de experiências. O que dava certo no consultório era aplicado também no hospital, e vice-versa.

Assim, o fato de as circunstâncias terem me levado a modificar o esquema de atendimento no ambulatório de Jurujuba, e tendo percebido que havia ali uma alternativa que poderia ser utilizada também na clínica particular, adotei esse esquema no atendimento de alguns clientes do meu consultório, principalmente para aquelas pessoas que estavam preocupadas com questões financeiras que poderiam atrapalhar seu processo psicoterápico.

Foram poucas que vivenciaram esse esquema no trabalho do consultório, todavia os resultados se mostraram bem interessantes, promissores e com bons resultados.

11- ENCONTRO SUDESTE da ACP 2007 -FRIBURGO – RJ

(UM GRUPO DO GRUPO)

Neste último relato, que agora lhes apresento, tento refletir um pouco sobre uma experiência vivida por mim nesse encontro de Friburgo, e que me fez pensar muito sobre o que ocorreu em um dos grupos do qual participei. Não considero que tenha sido uma vivência negativa. Não. Marcou-me pelo inesperado, pelo inusitado, pela surpresa.

Nunca tive a oportunidade de pensar nessa curiosa e, até certo ponto, desconcertante possibilidade, inerente à natureza do trabalho com grupos de encontro, tal como eles comumente são definidos.    Vamos aos fatos.

Nesse evento, não apresentei nenhum trabalho, não fiz nenhuma comunicação teórica… Fui para viver esse acontecimento. Participei de várias reuniões, fotografei e filmei MUITO. Estava muito feliz por rever tantos amigos, conhecidos e novas pessoas que atuavam na Abordagem em vários cantos do Brasil.

O ponto alto, para mim, era o encontro, principalmente quando estávamos quase todos lá, naquele salão grande.

Eu bebia cada palavra dita pelas pessoas ali presentes, sentia cada dor mencionada e cada vitória partilhada por elas com as demais que ali se reuniam. Parecia que eu estava hipersintonizado com tudo que acontecia conosco.

Em uma das noites, o encontro, diferentemente dos anteriores, mostrava-se um pouco “desorganizado”  e “improdutivo”.  Os temas não se aglutinavam e algumas pessoas começaram a ficar meio desmotivadas.

Aos poucos o grupo começou a se esvaziar.

A sensação que invadia o salão onde nos reuníamos era a de “acabou, já deu, não vai rolar mais nada hoje” e, progressivamente, as pessoas começaram a sair, uma a uma, ou em pequenos grupos, até que, tendo a maioria dispersado, poucos ainda permaneciam ali.

Eu já havia “visto este filme” algumas vezes, em outros grupos. Imediatamente fiquei “de orelhas em pé” e redobrei minha atenção, tentando compreender o que estava acontecendo.

De repente, percebi que havia umas 10 pessoas, talvez mais, talvez menos um pouco, que não mostrava disposição para seguir os que haviam já ido embora.  Uma delas, principalmente, falava de sua frustração diante do “término do grupo naquela noite”. Dizia ela: “ Eu precisava muito falar algumas coisas…”.

Naquele instante, imediatamente focalizei aquela fala e disse: “se você quiser, posso ficar aqui e ouvir o que tem a dizer”.

Com ar de surpresa e alívio, pessoa aceitou e me agradeceu.

As pessoas que ainda estavam por ali, perto de nós dois, começaram a se aproximar, e formaram um grupo menor. Com isso, foi criado um “novo grupo” ( na verdade um subgrupo do grupão ).

Permanecemos reunidos, ali, o tempo necessário para que todos pudessem participar desse encontro que se deu dentro do encontro maior.

A surpresa à qual me referi no inicio desse item, não ocorreu por causa do que aconteceu naquela noite: o subgrupo do grupo.  Isso pode acontecer naturalmente na vida de qualquer grupo.  O que me surpreendeu foi a reação das pessoas que não permaneceram no grupo, a das pessoas que foram para fora do salão considerando que o trabalho daquele dia havia terminado.

No dia seguinte havia um clima de censura pelo que acontecera na véspera. Era como se fosse uma “desobediência” ao que fora imposto àquela comunidade, pela maioria dos que dela participava.

Era como se não pudesse ter acontecido aquele grupo que nasceu do grupão, naturalmente, por uma necessidade de uma de suas partes, talvez a menor, um participante.

A grande questão que se colocou diante deste acontecimento foi: se o grupo é autodirigido, quem o dirige?

A estrutura natural de um grupo, ou seja, sua constituição, sua dinâmica , é determinada pela maioria?

Quem é a maioria em um grupo?

O grupo é o todo e, com isso, seus componentes, suas partes, não têm vida própria, ou autonomia para ter sua dinâmica particular?

Qual é o objetivo de um grupo de encontro?

Por quê um “subgrupo”, nascido no interior de um grupo maior, não parece, para algumas pessoas, uma coisa saudável e, às vezes até necessária para o crescimento de uma de suas partes?

O grupo deve apenas se preocupar com sua totalidade, com o crescimento dele como um todo, ou se preocupar também com os indivíduos que o formam?

As partes não compõem o todo? Elas são menos importante do que o todo?

Todas essas indagações, e outras, passaram pela minha cabeça. Até hoje, muitas delas me causam surpresa.

O trabalho com grupos, em suas mais diferentes formas, sem dúvida será sempre uma vivência muito rica, uma experiência inesquecível.

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