Psicologia Escolar
INTRODUÇÃO
Certo dia, na escola onde eu trabalhava, pediram que formulasse teoricamente o que seria, ou deveria ser, uma fundamentação psicológica que servisse de base para as atividades dos alunos pequenos, entre 3 e 5 anos de idade.
Senti grande dificuldade para realizar a tarefa que me haviam pedido e, em lugar de uma fundamentação teórica, tudo o que consegui escrever me pareceu mais um “desejo”, uma “viagem”, algo que brotava de dentro de mim, como se eu me imaginasse sendo uma daquelas crianças que via por lá, vivendo os primeiros dias de contato com um lugar onde eu poderia crescer, aprender, viver, relacionar-me, sonhar e até estudar.
A fundamentação “científica” e “teórica” solicitada, obviamente, não foi realizada. Em seu lugar, nasceu este pequeno texto que lhes apresento a seguir.
“PRÉ-ESCOLA”
(Algumas ideias a respeito)
José Luiz Belas – outubro de 1982
Andei pensando como gostaria que fosse uma escola para crianças pequenas (Maternal, Jardim de Infância…), na qual eu trabalhasse, participando do seu crescimento e desenvolvimento.
Cheguei a algumas conclusões:
Gostaria de trabalhar com pessoas interessadas em crianças, devotadas ao estudo do seu comportamento, que estivessem dispostas a refletir sobre suas atitudes frente aos pequenos, que fossem abertas às mudanças e que não tivessem medo de arriscar novas formas de agir e de pensar. Que se pudessem reunir com as crianças com a mesma seriedade com a qual se reúnem com grandes personalidades. Que quisessem aprender com os pequenos. Que amassem sua profissão e fizessem dela grande parte de sua realização como pessoa. Que fossem humildes o suficiente para nunca pensar ter chegado ao final em seus saberes.
Gostaria de ver crianças soltas, livres, correndo, sentindo o seu mundo, aprendendo a aprender, podendo plantar flores, criar pequenos animais, dialogar com todas essas coisas e pessoas.
queria ver crianças trepando em árvores, brincando de casinha, preparando uma festa, cantando músicas, deixando seu mundo de fantasias ganhar ares de realidade e poder participar disso tudo com elas.
queria poder apreender e retomar a minha própria infância a cada momento, através de um contato franco e aberto com essa gente de porte pequeno. Gostaria de ouvir suas estórias e contar-lhe as minhas.
Seria interessante ajudá-las a descobrir suas verdades, seus temores, suas alegrias, seus gostos, suas vontades, vê-las vislumbrar novos horizontes do saber, do sentir e do ser, através de questionamentos sobre cada coisa ou situação na qual estivessem mergulhadas a cada momento.
Penso no quão bom seria poder sorrir e chorar com elas pelas conquistas havidas, vê-las dormir sonos leves e tranquilos e participar de seus sonhos confusos, mas de mensagens tão singelas.
Imagino crianças de pés escurecidos de terra, de caras suadas, de narizes sujos, de mãos encardidas e de roupas já não mais tão alvas. Sentiria, nesses momentos, que elas estariam vivendo a plenitude de suas idades. Crianças de caras lambuzadas de feijão e bife, com dedos engordurados, aprendendo o que fazer com um garfo, uma faca, uma colher.
Queria vê-los como uma revoada de pássaros canoros, com blusas fora das calças e sapatos de cordões soltos, jogando bola, rolando pelo jardim, andando de balanço, brincando de pique-esconde.
Desejaria encantar-me, vendo seus rostos tão risonhos e alegres que, por assim estarem, não conseguiriam esboçar testas franzidas. Viveria intensamente com elas esses momentos de felicidade.
Escutaria, com toda atenção, os choros e os lamentos dessas crianças e tentaria, nessas horas de sofrimento, confortá-las, compreendê-las e ajudá-las a se enriquecerem com a dor.
Queria ver crianças brigarem pelo direito de serem elas mesmas, e de quererem fazer valer suas saudáveis vontades, desejos e aspirações.
Bom seria estar num ambiente no qual me sentisse bem comigo mesmo e com as demais pessoas que nele “habitam”, ser eu mesmo e aceitar que os outros sejam o que, de fato, são.
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Nota: O texto original foi publicado no “Jornal da Serra”, Nova Friburgo-RJ, em outubro de 1982.